O segmento de transporte rodoviário de cargas vem sofrendo, de forma acintosa, mudanças na legislação específica da atividade. Um bom exemplo, com o qual não podemos pactuar, é o que a Agência Nacional do Transporte Terrestre (ANTT) fez, por conta própria, ainda que supostamente apoiada na Lei, editando a Resolução ANTT n° 3.658/2011, que determina a obrigatoriedade de geração do Código Identificador das Operações de Transporte (CIOT), criando mais burocracia e custos invisíveis para o setor.
O CIOT foi criado sob o argumento de combater a informalidade e outras mazelas relacionadas à contratação de autônomos. Porém, isso não traduz a realidade, uma vez que o poder efetivo de fiscalização é de órgãos competentes, como INSS e Receita Federal.
O que realmente importa é apenas que o contratante realize o pagamento diretamente na conta do contratado, mantida em instituição integrante do sistema financeiro nacional, conforme estava determinado na chamada “carta frete” (Lei 11.442/2007).
O estranhamento é ainda maior diante da criação, pela ANTT, de uma nova figura no segmento: as empresas de Pagamento Eletrônico de Frete (PEF), responsáveis pela geração do CIOT. Como consequência disso, criou-se o custo dessa geração que, segundo consta, todas as empresas credenciadas deveriam oferecer de forma gratuita.
Na prática, todas as empresas oferecem a geração “gratuita” do CIOT somente se cada operação for digitada diretamente no site. Considerando que o registro pode levar de 10 a 15 minutos por documento fiscal (CT-e ou MDF-e), se a transportadora tiver 1000 CT-e para serem gerados, o tempo para esse trabalho poderá ser de 100 horas.
Entretanto, se a transportadora comprar um “leque” de serviços, poderá gerar o CIOT eletronicamente, dispensando a digitação. Ou seja, estamos falando de remunerar a operadora do pagamento eletrônico em 0,4% a 5% dos valores pagos ao Transportador Autônomo de Cargas (TAC) ou às equiparadas.
Não podemos pactuar com tais procedimentos, que forçam as empresas a arcar com mais custos e que não apresentam qualquer benefício.
E tem mais: para atender anseios escusos, a ANTT, por meio de Resolução, está alterando o texto legal da Lei 11.442/2007 art. Art. 5º-A que diz: “Equipara-se ao TAC, Empresa de Transporte Rodoviário de Cargas (ETC) que possuir em sua frota até três veículos registrados no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas (RNTRC) e as Cooperativas de Transporte de Cargas (CTC)”.
Segundo a Resolução ANTT 3.658/2011, art. 3o, “Equipara-se ao TAC, Empresa de Transporte Rodoviário de Cargas (ETC) que possuir em sua frota até três veículos automotores de carga registrados no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas (RNTRC), e as Cooperativas de Transportes de Cargas (CTC)”.
Por esta Resolução, uma empresa que possuir dois cavalos (veículo automotor) e duas carretas (veículo sem propulsão) estará fora da obrigatoriedade da geração do CIOT e do PEF, pois teria mais que três “veículos” registrados no RNTRC.
Não satisfeita, a ANTT novamente extrapolou a legislação e sua competência, quando editou a Resolução ANTT 4.799 DE 27/07/2015, sobre documentos que não são de sua alçada. A Agência criou, por conta própria, obrigações para as quais não está habilitada quando, no Art. 22, diz que, na realização do transporte rodoviário de cargas, é obrigatória a emissão do Manifesto Eletrônico de Documentos Fiscais (MDF-e) como documento que caracteriza a operação de transporte, as obrigações, as responsabilidades das partes e a natureza fiscal da operação, respeitado o art. 744 do Código Civil.
Primeiramente, a Agência parece desconhecer a Lei, pois o que caracteriza o transporte rodoviário de carga é o conhecimento de transporte ou contrato – este, sim, tem o vínculo legal e de controle para este segmento, pois está definido na Lei 11.442/2007, conforme descrito no Art. 6º: “O transporte rodoviário de cargas será efetuado sob contrato ou conhecimento de transporte, que deverá conter informações para a completa identificação das partes e dos serviços e de natureza fiscal”.
Quanto à obrigatoriedade ou não do MDF-e, isso é de competência exclusiva dos Estados, da mesma forma que o CT-e e a NF-e. Portanto, a ANTT não poderia contrapor a legislação específica e determinar, numa Resolução, a obrigatoriedade de emissão deste documento, quando os Estados já definiram que ele é válido apenas para operações interestaduais.
O mais estranho dessa situação é que o CIOT deve ser identificado no MDF-e. Logo, foi providencial legislar fora da sua competência.
Diante dos fatos e constatações citados aqui, não nos resta outra alternativa a não ser exigir que a ANTT altere a Resolução 3.658/2001:
- Mantendo apenas a obrigação prevista na Lei 11.442/2007. Ou seja, que o TAC e o equiparado sejam pagos diretamente em conta mantida em instituição financeira.
- Mantendo a equiparação da Empresa de Transporte de Carga (ETC) com o Transportador Autônomo de Carga (TAC) para quem tenha até três veículos (automotor, carreta ou implemento), sem geração de qualquer código.
Resta, portanto, exigir a extinção da geração do CIOT ou qualquer outro código não previsto em Lei. Bastando, para isso, que se altere a Resolução 4.799/2015, com a exclusão do art. 22, uma vez que a ANTT só pode regulamentar em face de lei específica do segmento. Lembrando que a normativa sobre a obrigatoriedade do MDF-e é de competência Estadual, ou seja, das Secretarias da Fazenda.
Esperamos que estes erros sejam corrigidos o quanto antes, de forma a tranquilizar o segmento do transporte rodoviário de cargas, que já vive as dificuldades de acompanhar e cumprir as legislações estaduais e federais (CT-e, MDF-e, SPED Fiscal, ECF, EFD, etc.) e, assim, evitarmos um passivo oculto.
Fonte: Blog do Caminhoneiro.